The Last of Us II foi a muito aguardada sequência de The Last of Us, lançado em 2013. A saga apocalíptica foi sucesso absoluto em seu primeiro título, mas tem dividido muito as opiniões dos fãs no seu segundo lançamento. A produtora Naughty Dog conseguiu fazer um excelente trabalho pegando tudo de melhor que o primeiro título teve e aprimorando um a um.
Outro jogo passou por uma polêmica semelhante recentemente, Cyberpunk 2077. Apesar de ser um jogo extremamente ambicioso e de altíssimo nível, foi recebido de forma terrível por grande parte dos fãs.
A nível técnico, The Last of Us II é certamente um grande avanço em relação ao anterior, portanto paira a dúvida: Qual é o grande problema?
A história de The Last of Us II
The Last of Us II parte de 5 anos após os eventos do primeiro jogo, já nos trazendo uma mudança logo de início em que agora, ao invés de acompanharmos a história pelos olhos de Joel, acompanhamos pelos olhos da pequena Ellie. Os dois se estabeleceram na pequena cidade de Jackson onde o irmão de Joel, Tommy, vive com sua esposa Maria.
Para quem não quer spoilers de nenhum dos títulos, prepare-se porque daqui em diante já teremos uma avalanche deles. O jogo começa com Joel explicando a Tommy os eventos do final do primeiro jogo, já estabelecendo muito bem os conflitos que o segundo título irá abordar. O maior segredo de Joel é revelado ao irmão, de que Ellie parece ser a única pessoa imune à contaminação e que o estudo que os cientistas querem fazer causariam a morte dela.
O que segue daí em diante é um certo tutorial, orientando os jogadores nas mecânicas do primeiro jogo e também nas novidades como esquiva, entre outras. Os jogadores também são introduzidos à misteriosa Abby, que também está seguindo o caminho para o rancho de Tommy em Jackson. O jogador tem a possibilidade de jogar com Abby, uma personagem claramente muito mais poderosa fisicamente do que Joel ou Ellie. Seu combate é bem agressivo e brutal, e a produção soube encaixar isso na jogabilidade da personagem de maneira fantástica.
Pouco depois, chegamos a um dos momentos de The Last of Us II mais discutidos pelos fãs. O momento em que Joel, protagonista do primeiro título, é baleado na perna e capturado por Abby, mesmo depois de tê-la ajudado. Abby o tortura lentamente e Ellie chega bem a tempo de vê-la assassinar Joel com um taco de golf. Este desfecho de Joel é um dos pontos mais criticados pelos fãs da série, que alegam que a morte foi usada apenas para causar choque aos jogadores mas não fez justiça ao personagem de Joel.
Pessoalmente, acredito que esta foi uma excelente decisão, quebrando o esperado por todos e colocando ainda mais em evidência o quão brutal é o mundo pós-apocalíptico em que a história se passa. Além disso, cria o elemento principal que rege todo este segundo título: O desejo por vingança de Ellie.
Muitos jogos atualmente são focados em dar ao jogador escolhas e liberdade para jogar como preferir, tendo todas as decisões em suas mãos. No entanto, The Last of Us II é diferente. O jogo é uma experiência narrativa que te permite apenas jogar com personagens definidos dentro de uma história que está sendo contada a você, sem que te dê o poder de alterá-la.
Isso nos leva, em alguns casos, a questionar algumas decisões tomadas pelos personagens, como Tommy e Joel revelando seus nomes para Abby e seu grupo, por exemplo.
Após a morte de Joel, Ellie parte para Seattle quando descobre que Abby é parte da WLF (Washington Liberation Front), um grupo paramilitar. Ela então decide ir atrás de todos os envolvidos na morte de Joel e assassiná-los, um a um. Daí, o jogo segue Ellie em Seattle atravessando o inóspito território em busca de retribuição com aqueles que a machucaram. A cidade de Seattle é o cenário principal de The Last of Us II e é muito bem construído para dar o clima pesado e frio que o jogo quer passar ao jogador.
Os principais temas de The Last of Us II giram em torno do ciclo de violência, ódio e vingança, e como eles nunca resultam em nada bom.
Mais adiante, Ellie descobre que Abby e seu grupo eram parte da equipe que Joel encontra preparando Ellie para a cirurgia que iria matá-la (e talvez salvar todo o planeta) no hospital St. Mary no primeiro jogo. Joel, nesta ocasião, assassina um cirurgião que Ellie descobre agora ser o pai de Abby. É neste momento que Ellie e o jogador percebem que a história de Abby é idêntica à busca por vingança em que Ellie se encontra agora.
Os flashbacks de The Last of Us II, em que o jogador tem a chance de jogar com Ellie mais jovem, são algumas das melhores sequências do jogo, entregando uma visão aprofundada do relacionamento entre Joel e Ellie dentre o primeiro e o segundo títulos.
The Last of Us II fez um excelente trabalho ao retratar a brutalidade e frieza do universo do jogo ao longo da história, especialmente abordando as mortes de personagens e suas consequências. Conforme Ellie avança em sua vingança e consegue assassinar grande parte do grupo de Abby, eventualmente ela é confrontada por ela no teatro que está usando como esconderijo.
Durante este confronto e após ele, o jogador assume o papel de Abby, e aí começa a polêmica de The Last of Us II. Este é um dos pontos mais controversos discutidos pelos fãs, muitos alegando que ficaram desapontados com o jogo por fazerem isso. A reclamação geral é de que o jogador está desde o primeiro título torcendo por Ellie e Joel, e assumir o papel da “vilã” não gerou nenhuma empatia destes fãs. É compreensível ter certa resistência a atacar e tentar matar aquela menina que você fez tudo pra salvar durante todo o primeiro jogo (e vêm fazendo também no segundo).
Não há como negar que foi uma jogada ousada e ambiciosa da Naughty Dog fazer isso em The Last of Us II, já que não se vê em todo jogo uma mudança de jogabilidade brusca como essa. Apesar das reclamações, não é unanimidade que foi uma má decisão, já que uma enorme parte dos fãs achou fantástica esta mudança de papéis. Os que gostaram, já alegam que foi interessante especialmente pela forma que o jogo decidiu abordar este ciclo de violência e vingança, mostrando que Abby foi uma vítima de terríveis circunstâncias em busca de vingança, exatamente como Ellie.
Ainda tratando da narrativa ambiciosa, a Naughty Dog também arrisca bastante nas decisões tomadas pelos personagens e em seus destinos. O primeiro título tratava de um núcleo muito menor de personagens e se beneficiava disso sendo uma narrativa mais focada e linear. The Last of Us II, por outro lado, já é uma excitante jornada épica de vingança, jogando em linhas do tempo diferentes e analisando as situações pelos olhos de diferentes lados da história.
Tanto Abby quanto Ellie perdem todos que amam por consequência de suas obcessões por vingança, e nada é, de fato, resolvido. O jogo aborda este ponto múltiplas vezes, especialmente no final, mas nele entraremos mais à frente.
A jogabilidade de The Last of Us II
Como comentado no começo do artigo, é seguro afirmar que de um ponto de vista técnico, The Last of Us II não deixa nada a desejar nos quesitos gráficos, sonoros e artísticos. A sonoridade do jogo é fantástica, os gráficos excelentes e a jogabilidade muito aprimorada em relação ao seu antecessor.
The Last of Us II introduz várias novas mecânicas para melhorar os combates corpo a corpo. Ellie e Abby possuem estilos totalmente diferentes, com Abby sendo mais agressiva e bruta, e Ellie sendo mais furtiva e assertiva. As novas mecânicas de esquiva e de se arrastar pelo chão deram uma nova dinâmica ao combate. No entanto, o botão de pular que foi acrescentado não tem basicamente utilidade nenhuma.
O combate está de fato, mais satisfatoriamente sangrento. Socar com uma grande variedade de armas brancas, ou atirar em pessoas e infectados está bem mais divertido do que no primeiro jogo. Toda arma tem sua função específica e seu personagem atua de forma diferente com cada uma delas. Apesar das armas de corte e de força bruta acabarem se comportando de forma bem similar, os movimentos estão bem construídos e fazem um excelente papel na imagem e jogabilidade de The Last of Us II.
Os inimigos, desde humanos a infectados, todos parecem de certa forma únicos. Novos infectados têm estratégias diferentes, enquanto a WLF e os cultistas da Saraphite usam diferentes armas e táticas. A WLF possui armas militarizadas e utiliza de cães farejadores para te encontrar, enquanto o culto usa de algumas armas e arcos com flechas, mas são focados em ataques mais furtivos e silenciosos. A inteligência artificial dos personagens em combate não parece ser muito diferente do primeiro título, mas estas mudanças já agregaram certa variedade e são certamente desafiadores.
Um pequeno fato que deve ser pontuado é o esforço do jogo em humanizar os personagens, algo que vemos durante toda a trama. Agora em combates, quando você mata alguém de um grupo, você geralmente irá ouvir outro membro do grupo gritando o nome de sua vítima. É um pequeno detalhe, mas que mostra mais uma vez o esforço da produtora em humanizar os personagens de The Last of us II.
Apesar do combate ter sido aprimorado, não leva muito tempo até o jogador começar a sentir que está repetitivo e cansativo demais. Os combates funcionam perfeitamente para a história, mas analisando apenas a jogabilidade, eles ficam repetitivos por não serem tão flexíveis quanto outros jogos.
Em jogabilidade, The Last of Us II não é tão diferente de seu antecessor, e todos os encontros com inimigos acabam de desenvolvendo sempre da mesma forma. No entanto, áreas maiores de combate criaram dinâmicas mais interessantes de movimento e deixam o combate mais divertido, apesar de também deixá-lo mais demorado.
Veredito final
A decisão de colocar o jogador nos pés de Abby foi arriscada e bem fora do padrão dos jogos atuais, portanto é de se esperar certos feedbacks negativos. Apesar disso, os jogadores que chegarem abertos à experiência poderão vivenciar uma relação totalmente original entre jogador e personagens. Especialmente porque a história dela é um dos melhores aspectos do jogo. Aos olhos de Abby, são Joel e Ellie os vilões.
Joel matou seu pai e Ellie está matando todos os seus amigos, mesmo depois de a deixarem viver. Seguindo sua história, vemos Abby até mesmo ajudar um casal de crianças que está sendo perseguido por um culto. Este arco acaba sendo uma das maiores forças de The Last of Us II, e querendo ou não, acaba redimindo as ações de Abby aos olhos do jogador. Obviamente não todos, já que a reclamação de muitos é exatamente a de que “humanizaram” demais a vilã que torturou friamente Joel, o grande herói do primeiro jogo.
Muitos jogadores também ficaram decepcionados com o final de The Last of Us II em que Ellie acaba deixando Abby ir embora e não vinga a morte de Joel. No entanto, no ponto de vista da história e da mensagem que o jogo deseja passar, foi o final perfeito para a sangrenta trama. A decisão de Ellie de ir atrás de Abby nos últimos momentos do jogo faz com que Dina e o bebê a deixem, e ela fica completamente sozinha no fim. Isso encaixa perfeitamente com o ponto de que a violência e vingança que Ellie busca acabam trazendo consequências piores e fora do controle de qualquer um.
Enfim, The Last of Us II certamente não agrada a todos, e a decepção dos jogadores (especialmente os fãs do primeiro título) acaba sendo bem justificada. A forma de construção da narrativa, ainda que bem feita, quebra o ritmo frenético do jogo em diversos momentos, algo que não acontecia no primeiro título.
The Last of Us II pode não ser uma obra prima aos olhos de todo mundo, mas está longe de ser uma decepção também. É um excelente jogo e arrisco dizer, um dos melhores dos últimos tempos. O final é extremamente emocionante, especialmente para quem tem a memória fresca do primeiro jogo em que ela diz em certo momento que seu maior medo era o de “ficar sozinha no fim das contas”, e é exatamente isso o que suas ações causam a ela.