Todo mundo conhece The Sims. The Sims Mobile foi um jogo que já saiu na frente de maioria devido à essa vantagem. A simulação de uma “vida real” traga pela franquia não só definiu os rumos do gênero de simulação como conta entre os jogos mais vendidos em todas as plataformas.
The Sims Mobile foi lançado mundialmente em março de 2018 após um longo e tumultuoso lançamento, onde várias alterações foram feitas nas mecânicas do jogo. Mesmo com excelentes gráficos e uma estratégia de lançamento bem elaborada por uma empresa de marketing, The Sims Mobile ainda acabou derrotado. Levou menos de um mês para que o jogo de seis anos antes, Sims FreePlay, já estivesse performando melhor em receita que o mais novo, mesmo considerando o fato de que os downloads diários de The Sims Mobile foram quatro vezes maiores que seu antecessor nos primeiros dias após o lançamento.
Seria fácil fazer um caso, baseado em números, mostrando que lançar sequências pra plataformas mobile não é uma boa ideia. Afinal de contas, o que não faltam são exemplos disso. Acontece que no caso de The Sims Mobile, não parece ter sido este o problema. O jogo falhou por um motivo muito mais simples: mecânicas pobres que acabam não entregando tudo que fez da franquia The Sims uma febre.
Conteúdo da postagem
Analisando os jogos anteriores
A genialidade da franquia de The Sims se baseia em sua acessibilidade. Os jogos são fáceis de entender e você como jogador, rapidamente entende o que é esperado de você e de seus sims ali, baseado principalmente nas suas próprias experiências de vida. A métrica do sucesso não precisa sequer ser explicada porque elas já são as nossas como seres humanos: faça mais dinheiro, seja promovido, se case, curta a vida. A franquia cria nossas fantasias e nos dá a chance de realizá-las ali.
Matt Brown, diretor técnico da EA Maxis, revelou recentemente que a narrativa criada para o primeiro The Sims foi baseada nas tendências naturais dos seres humanos e inspirada principalmente na pirâmide de Maslow. Estas necessidades automaticamente criam uma estrutura linear para a jogabilidade do game:
- Sim está com fome;
- Sim precisa de uma geladeira para armazenar comida;
- Para ter a geladeira, ele precisa de dinheiro;
- Sim consegue um emprego.
Além disso, os sims possuem alguns comportamentos automáticos que buscam aliviar necessidades mais emergentes ou seguir com atividades que já desempenhavam antes. Um sim que trabalha em um restaurante e busca a carreira de chef, por exemplo, tem maiores chances de começar a cozinhar sem receber um comando direto para isso.
Se você tem uma casa com vários sims, esta automatização é uma estratégia dos desenvolvedores para que seus sims se mantenham no caminho que você traçou pra eles sem que precise estar acompanhando todos a todo momento, o que seria uma tarefa basicamente impossível.
Ao mesmo tempo, o resultado de cada ação é visível e dá significado a cada uma, mostrando ao jogador que está fazendo progresso em algum sentido. Ações em The Sims te recompensam de forma muito mais gratificante do que na vida real. Se você lê um livro, aumenta sua habilidade de Lógica em um ponto. Se conversa com alguém, vê sua barra de relacionamento com aquela pessoa subir.
Esta mecânica também cria novos objetivos imediatamente: Leia livros para subir seu nível de lógica e ser promovido. Converse com uma pessoa por tempo suficiente para criar relacionamento a ponto de se casarem.
No geral, o jogo é uma excelente combinação de ações que o jogador controla e ações a que o jogador apenas reage. Estas foram as principais marcas que tornaram a franquia um sucesso mundial.
The Sims se torna gratuito
Sims FreePlay foi lançado em 2011 para plataformas mobile, e é desde então um dos jogos mais baixados e com a vida mais saudável da Play Store. Esta versão mobile trouxe os conhecidos timers para quebrar as sessões e entregar algum progresso enquanto o jogador não está de fato jogando. Estes timers quebram bastante o ritmo do jogo e fazem ele parecer bem diferente do original, mas ainda assim, mantém um público estável. Possivelmente porque conseguiram se manter fiéis aos princípios básicos da franquia, mantendo a tomada de decisões bem parecida com os jogos anteriores.
The Sims Mobile já foi lançado em maio de 2017 no Brasil como um primeiro ambiente de testes, e foi lançado para o resto do mundo somente em março de 2018. Neste primeiro momento, você já vê claramente como The Sims Mobile é diferente dos demais jogos da franquia. Você já encontra de imediato gráficos consideravelmente melhores do que os de seu antecessor, com uma experiência 3D completa e uma vasto leque de animações, lembrando até mesmo o título The Sims 4 para PC.
Mas e então, como The Sims Mobile se saiu? Em poucos meses após seu lançamento mundial, o jogo já perdeu a posição entre os 100 jogos mais rentáveis do mundo. The Sims FreePlay, por outro lado, manteve esta posição mesmo após o lançamento e a queda de The Sims Mobile, mostrando uma preferência clara dos fãs da franquia pelo jogo anterior.
Este resultado está longe de ser bom para um jogo com gráficos tão bem trabalhados e que ficou quase um ano em versão beta no Brasil. Então, o que aconteceu?
Desconstruindo The Sims Mobile
Foco em poucos sims
Diferente dos jogos anteriores da franquia, The Sims Mobile permite ao jogador controlar no máximo quatro sims que compartilhem uma mesma casa. No entanto, pra manter o jogo interessante e permitir ao jogador “viver diferentes vidas”, em algum ponto os sims podem se “aposentar”. Isso libera o espaço para uma nova geração. Se você aposentar um de seus sims eles continuarão na casa podendo realizar certas ações que gerem tokens e eventualmente, irão para uma fazenda e sairão definitivamente da casa.
Os tokens permitem ao jogador comprar itens que desbloqueiam ou melhoram atributos de seus sims. O sistema funciona bem: o jogador não fica sobrecarregado com muitos sims, explorando diferentes histórias que acompanham cada personagem e além disso, há uma certa “herança” que as gerações anteriores deixam para as mais novas.
Isto também serve como uma ferramenta de retenção para jogadores focados em conquistas para The Sims Mobile. Estes atributos realmente foram uma boa sacada na adaptação do game para plataformas mobile.
Progressão dos sims
Como jogador, você pode designar eventos para seus sims, que nada mais são do que missões com diferentes durações. Estes eventos são parte das histórias: carreira, hobbies e relacionamentos. Para hobbies e carreiras, apenas um pode estar ativo de cada vez para cada sim e trocar vai te custar alguns simoleons. Relacionamentos podem ser explorados em paralelo, o que mantém em The Sims Mobile uma das características mais importantes dos games anteriores.
Cada sim pode ser designado a um evento de cada vez e ele irá concluí-lo sozinho. Isto te permite avançar no jogo nos momentos em que não está de fato jogando, o que traz um novo respiro ao jogo toda vez que abrir novamente e tiver vários eventos concluídos.
Para o jogador ter sua chance de agir, cada sim também tem uma “energia” que pode ser uma para executar ações opcionais durante o evento para acelerar o relógio. O jogador escolhe as ações a serem feitas através de pontos de interação que estão disponíveis apenas durante o evento.
Os eventos alimentam tanto o progresso do jogador como o progresso de seus sims em The Sims Mobile. Eles se amarram bem: completar um evento significa mais experiência para o jogador e um passo na história do sim.
Decorando sua casa
O sistema de decoração de The Sims Mobile, assim como o de seus antecessores, visa também acompanhar o progresso dos jogadores na mesma medida. Existem dois caminhos de progresso: nível do jogador e nível de vaidade. O nível do jogador vem basicamente de concluir os eventos. Eles liberam novas partes de cidade, novas carreiras, móveis e roupas.
Decorar e comprar roupas aumenta sua vaidade em The Sims Mobile, o que serve para comparação com outros jogadores e desbloqueia mais espaço na casa.
Montando seu sim
Roupas e cosméticos para seus sims são diferentes de decorações em The Sims Mobile. Eles custam Simoleons e aumentam seu nível de vaidade. Maioria das roupas e cosméticos não possuem um efeito no jogo.
Para obter roupas que tenham efeitos diretos no jogo, você precisa ir a um alfaiate especial que irá gerar roupas únicas, mas aleatórias. Estas roupas irão geralmente dar um gás em alguma atividade ou melhorar algum atributo de seu sim.
Estas roupas costumam chamar a atenção de outros jogadores e facilitar muitas relações sociais. Ser visto com estas roupas pode te gerar stickers, que são basicamente “likes” de outros jogadores. Estes stickers podem ser trocados por tokens que por seu lado, podem ser trocados no alfaiate por novas roupas especiais.
Para seu sim ser visto em The Sims Mobile, você precisa ir a festas.
Festas
Você pode visitar ou até mesmo fazer suas próprias festas. Pode fazer uma festa de casamento quando se casar, festas musicais quando você tiver instrumentos como hobby, e daí em diante. Estes acontecem em paralelo aos demais jogadores. The Sims Mobile dá até mesmo a possibilidade de conversar em tempo real com outros jogadores durante estas festas.
Conhecendo gente nova
Nenhum jogo da franquia estaria completo sem os diversos estranhos que você pode conhecer mundo afora. The Sims Mobile traz uma novidade ao criar um sistema de vizinhança onde parte de seus vizinhos são NPCs, e outros são jogadores reais.
O jogo consegue fazer sua vizinhança parecer real. Pessoas que você conhece terão maior possibilidade de encontrá-lo depois ou passar em frente à sua casa. Outras que você nunca quiser conversar, irão pouco a pouco sumindo de sua vista. Seria interessante saber exatamente como é o sistema criado pela EA Maxis para atualizar as vizinhanças desta forma e manter um bom equilíbrio.
Infelizmente, aqui chegamos em um dos pontos que realmente assassinaram The Sims Mobile. As relações sociais não contribuem proporcionalmente para seus objetivos principais no jogo e com isso, o jogador sente-se desmotivado e não vê valor naquele ponto tão primordial do jogo.
Os problemas de The Sims Mobile
O começo do artigo foi carinhoso, afinal de contas, adoramos a franquia. Mas agora é hora de assunto sério.
Isso fica nítido após poucos dias jogando The Sims Mobile. O “esqueleto” do jogo e sua estrutura básica estão em conflito direto com tudo que tornou a franquia o sucesso mundial que é. Resumindo, parece que o jogo está mal porque ele torna as motivações muito mecânicas, não recompensa adequadamente o jogador e carece muito de decisões relevantes ou objetivos motivadores.
O dia-a-dia
O sistema de atender às necessidades básicas de seus sims nos jogos anteriores era excelente. O sistema era baseado em três coisas: dar ao jogador uma ação imediata com uma chamada, criar uma narrativa coesa e gerar a necessidade para itens melhores. Isto entra no que foi citado no começo do artigo, criar um loop de atividades que se completam e se renovam constantemente.
Além disso, através disso você gera real empatia com seu sim, o que desperta no jogador e necessidade de “cuidar” dele. Esta é a base do jogo, ela será repetida várias vezes e você ficará satisfeito com isso. Após vários banhos em uma banheira ruim, juntar simoleons e conseguir comprar uma melhor proporciona ao jogador um forte sentimento de conquista, assim como na vida real.
Concluindo estes passos, novas necessidades mais complexas surgem como relacionamentos e carreira. Completar estes passos naturalmente cria a história de seus personagens e criam um sentimento do jogador com eles. Com uma combinação perfeita de atividades que se entrelaçam, o jogo não precisa pegar o jogador na mão e ficar ensinando o que ele precisa fazer.
Originalmente, montar sua casa é encontrar um meio termo entre custo, função e personalidade. Móveis podem ajudar com determinadas necessidades ou até mesmo aumentar habilidades. Móveis melhores geram um avanço mais rápido, papéis de parede aumentam o bem estar de seus sims. Tudo isso gera no jogador a necessidade de estar constantemente atualizando a casa de seus sims.
The Sims Mobile já mudou bem esta história. Você ainda pode interagir com objetos de sua casa mas como não há o sistema de necessidades, esta interação não entrega nada do que falamos antes, nem pro sim, nem pro jogador. Com isso, o jogador perde o interesse nesta construção da casa. O único estímulo de The Sims Mobile para comprar móveis e afins é aumentar o nível da vaidade. Eliminar estas necessidades e consequentemente as funções da mobília da casa causou um impacto terrível na experiência do jogador.
Sem este sistema, uma parte enorme do jogo desaparece, parte esta que poderia ser muito bem recebida por um público que joga casualmente. Pessoas que assistem TV jogando Candy Crush, por exemplo. Interagir com seu jogo com um sentimento constante de progresso é uma ótima ferramenta para ganhar estes jogadores. Além disso, aumenta o sentimento de pertencimento do jogador ao espaço que você construiu ao seu modo.
Isso leva automaticamente os jogadores de The Sims Mobile a terem sessões de jogo curtas e objetivas demais. A narrativa de montar seu sim e colecionar mobília é substituída pela motivação rasa de apenas concluir missões para ganhar recompensas. Jogadores que jogam apenas para estes objetivos não ficam muito tempo no mesmo jogo, afinal de contas, não há uma motivação palpável para seguir concluindo aquelas missões.
Relacionamentos
As histórias são os tijolos que montam as vidas de seus sims. Em The Sims Mobile, quando você conhece um novo sim você escolhe uma de três introduções: amigável, romântico ou confrontacional. Isso determina toda sua história com aquele sim dali em diante. Aqui foi um ponto em que o jogo perdeu mais um atributo importante de seus antecessores: os relacionamentos devem ser um retrato de relacionamentos reais. Relacionamentos são sempre mutáveis e é incerto para onde as coisas vão. Travar um relacionamento em uma história pré-moldada te induz a um caminho sem saída a não ser abandonar o progresso da história.
Com isso, The Sims Mobile perde mais motivação ao tirar do jogador a opção de tomar escolhas. Você não terá nenhuma surpresa, nenhuma chance de tomar o volante. Você é só um passageiro. É impossível brigar com um namorado ou um amigo. Ter que jogar para completar conquistas vazias tira ainda mais sua opção de tomar decisões. Ao invés de jogar o que quer, tem que fazer o que a missão manda e com isso você se desprende de seu sim, que virou só um robô executando tarefas.
Considerações finais
É impossível não pensar no que teria sido de The Sims Mobile se ao invés de mudarem as mecânicas do jogo, fizessem apenas uma versão de The Sims 4 para a nova plataforma. Todo o encanto do jogo se perdeu no mesmo erro que diversos jogos vêm cometendo. Querer levar para o mobile um jogo gratuito que se baseia em uma mecânica pobre como a de missões e recompensas é uma medida que só tem trazido prejuízo às desenvolvedoras de games.
É bom que isto aconteça porque, afinal, já passou da hora do mundo mobile passar por uma renovação neste sentido. A plataforma comporta jogos bem elaborados, inteligentes e que podem realmente conquistar o jogador ao invés de ser só “mais do mesmo” com uma nova cara e nome.
Isso se agrava quando tratamos de The Sims. Afinal de contas, o jogo sempre foi um recanto de total liberdade. Agora, você é um robô que toma decisões fúteis e sem valor nenhum. As empreitadas mobile da franquia foram um fracasso, só nos resta torcer para que o mesmo não aconteça nos jogos para PC.
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Curte jogos de simulação no celular? Confira nossa análise sobre The Simpsons: Tapped Out!
The Sims Mobile
Pros
- Gráficos bons
Cons
- Mecânicas travadas
- Zero liberdade e controle
- Perda das necessidades
- Relações sociais rasas
